Redução no orçamento das universidades federais e mudanças na política para os povos indígenas
Publicado 09/05/2019 - Atualizado 16/08/2019
Fatos relevantes e medidas do governo
Golpe de 1964
O mês começa com o vídeo defendendo o golpe de 1964 e agradecendo os militares, divulgado pelo whats app do Planalto. O empresário Osmar Stábile, ex-vice-presidente do Corinthians, assumiu a autoria do vídeo. O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) não se posicionou sobre a questão.
Direitos indígenas
O Ministério Público (MP) quer reparação a indígenas por abusos cometidos ao longo dos 21 anos do regime militar. A Comissão Nacional da Verdade examinou 25 mil processos, dos quais 9.755 preveem algum tipo de reparação econômica. Desses, apenas um envolve indígenas. De acordo com dados da própria Comissão, cerca de oito mil indígenas morreram em ações da ditadura militar.
A ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, afirmou que a iniciativa do MP de rever, de forma genérica, indenizações concedidas nos últimos anos, não foi um bom sinal no meio. O presidente Jair Bolsonaro também atacou fiscais do Ibama, ONGs e ameaçou cortar a diretoria da Funai.
A 15ª edição do Acampamento Terra Livre reuniu quatro mil indígenas e representantes de 170 etnias, entre 23 e 27/04, mas as lideranças indígenas não foram recebidas pelo governo, e nenhum membro do alto escalão procurou os organizadores do evento para uma reunião.
No entanto, o MMFDH promoveu, na tarde da terça-feira (23/04), uma reunião para discutir a situação dos indígenas venezuelanos acolhidos no Brasil, no contexto do fluxo migratório.
Educação
No dia 30/04, o ministro da Educação Abraham Weintraub anunciou que cortaria 30% das verbas de três universidades federais (Universidade de Brasília – UnB, Universidade Federal da Bahia – Ufba e Universidade Federal Fluminense – UFF), escolhidas, segundo ele, pelo baixo desempenho acadêmico e por promoverem “balbúrdias”. A reação de diferentes frações da sociedade foi grande. Diante da grita, em pleno dia 1º de maio, o ministro declarou então que os cortes serão estendidos a todas as Universidades Federais.
Governo assinou ato que institui a nova Política Nacional de Alfabetização e a publicação das regulamentações da educação domiciliar e da Lei Brasileira de Inclusão, iniciativas anunciadas pelo Ministério dos Direitos Humanos. O decreto de alfabetização mantém foco no método fônico e, em caso de reprovação, o aluno de ensino domiciliar terá de voltar à escola.
Previdência
Após mais de sessenta dias de tramitação, a Reforma da Previdência (PEC 6/2019) foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, o primeiro colegiado que deveria analisar a proposta. Após semanas de discussões, a aprovação da PEC 6/2019 na comissão só foi possível graças a um acordo do governo com o centrão, que exigiu a retirada dos seguintes itens, considerados inconstitucionais pela CCJ: retirada dos direitos do FGTS a empregados aposentados, mudança na competência da Justiça Federal para julgamento de ações contra o INSS e transferência da natureza normativa da Previdência Social da Constituição para lei complementar. Esses itens foram retirados da reforma em relatório substitutivo aprovado pela CCJ.
Nas celebrações de 1º de maio, em São Paulo, as centrais sindicais definiram o dia 14/06 como data para a greve geral contra o desmonte da Previdência.
Conselhos
O governo extinguiu conselhos federais com atuação da sociedade civil com o Decreto 9759/2019, entre eles os conselhos LGBT, indigenista, sobre trabalho escravo, pessoas com deficiência, idosos, entre outros que estão subordinados ao MMFDH. Os ministérios têm até o dia 28/05 para informar à Casa Civil todos os órgãos que existem em suas pastas e apresentar propostas de recriação dos que não desejam ser encerrados.
A meta é reduzir de cerca de 700 para 50 o número de colegiados, e o objetivo alegado é desburocratizar e trazer mais economia para a administração pública.
Segundo Bolsonaro, essas entidades são aparelhadas politicamente e impõem suas vontades, ignoram a lei e atrapalham propositalmente o desenvolvimento do Brasil, pois não se importam com as reais necessidades da população.
O Decreto 9.759 também encerrou o Grupo de Trabalho Perus, responsável pela identificação de corpos de desaparecidos políticos. O grupo era vinculado à Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, vinculado ao MMFDH, e tinha a missão de concluir a identificação de vítimas da repressão política durante a ditadura militar. O decreto não atinge só o Grupo de Perus, mas também o Grupo de Trabalho Araguaia.
Assim, pesquisadores de várias universidades, em sua maioria públicas, criaram a Campanha “O Brasil precisa de conselho”, para conscientizar sobre a importância que possuem os conselhos de participação social para o processo democrático e que a democracia vai além das eleições. A campanha vai durar três meses e vai atuar nas redes sociais com vídeos e textos discutindo o assunto.
Mercado de trabalho
No mercado de trabalho, o país perdeu 63.624 vagas de emprego formal em março, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Março apresentou uma variação negativa de -0,17% em relação ao estoque do mês anterior.
No acumulado do ano, a queda foi de 64.378 postos de trabalho. E, nos doze meses, a perda chega a 1.090.429 postos de trabalho formal. Já a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua acusou que a taxa de desocupação no Brasil atingiu 12,7% e a subutilização (que congrega desocupados, desalentados e que trabalham poucas horas na semana) chegou a 25%, tudo no primeiro trimestre de 2019. Em termos absolutos, são hoje 13,4 milhões de brasileiros desocupados (1,2 milhão a mais que no último trimestre de 2018), 65,3 milhões fora da força de trabalho e 28,3 milhões de subutilizados (recorde histórico). Já o número de desalentados chegou a 4,8 milhões.
Reforma Administrativa
A desarticulação política do governo no Congresso põe em risco pontos-chave da reforma administrativa proposta pelo presidente Jair Bolsonaro, entre elas a migração da Fundação Nacional do Índio (Funai) para o MMFDH. O prazo para que a MP caduque termina em 3 de junho. Se a medida não passar, volta a composição de ministérios do governo de Michel Temer.
O presidente Jair Bolsonaro, sancionou no dia 26/04, a Lei n° 13.819/2019, que institui a Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio, que, além de medidas de notificação, inclui um serviço telefônico gratuito para atendimento do público.
Paralelamente, o MMFDH lançou a campanha Acolha a Vida, com foco na prevenção ao suicídio e automutilação, contando com parceiros profissionais da educação e da saúde.
Lançou também o Observatório Nacional da Família (ONF), que visa acompanhar casos, situações e fatores que influenciam os índices de automutilação e suicídio.
Seppir
A Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) reafirmou acordo de cooperação para programa de bolsas de estudos para a carreira diplomática voltado à população negra. A secretaria também manifestou-se publicamente para repudiar os comentários racistas proferidos pelo sr. Adilson Durante Filho, conselheiro do Santos Futebol Clube, de que “pardos e mulatos brasileiros são todos mau-caráter”.
Combate ao feminicídio
A Secretaria Nacional de Políticas para MMFDH vai realizar ações de combate ao feminicídio. Uma das medidas anunciadas é a campanha “Salve Uma Mulher”, lançada pelo ministério no dia 8/03. A campanha tem o objetivo de enfrentar a violência contra o público feminino.
Análise crítica
Sobre o corte na educação superior, por um lado, o argumento do governo é extremamente autoritário e fere a autonomia das universidades federais, garantida para que não se repetisse a experiência das intervenções que ocorreu durante a ditadura militar. Por outro lado, o argumento de que estaria “moralizando” as instituições serve para mascarar a incompetência do governo em garantir orçamento para áreas fundamentais do país: o Ministério da Educação necessitava realizar cortes em algum lugar, já que sofreu contingenciamento de R$ 5,8 bilhões de seu orçamento em março deste ano.
Com o projeto de regulamentação do ensino domiciliar, bandeira bastante defendida especialmente pelos evangélicos, o governo se desobriga da universalização do ensino.
O governo encontrou enormes dificuldades para a aprovação do texto da reforma da Previdência logo na primeira etapa da tramitação. Cabe destacar que a CCJ analisa somente a legalidade e a constitucionalidade da proposta, não cabendo a ela alterações no mérito. Ainda sim, a costura de um acordo para a aprovação do texto, que já sofreu alterações importantes, foi confusa, longa e representou, na verdade, uma grande dificuldade do governo de tramitar as suas restrições a direitos da classe trabalhadora.
Nas alterações, podem-se destacar a manutenção do direito ao FGTS para os aposentados que continuam trabalhando e a manutenção da definição da aposentadoria compulsória pela Constituição, ao contrário do que queria o governo, numa ação que inclusive aponta para uma tentativa de aumentar o número de ministros do STF [e do STJ, que poderiam ser substituídos durante a gestão de Bolsonaro.
O centrão já manifestou, inclusive formalmente, que quer ainda mais alterações no texto, como quanto à capitalização, ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a aposentadoria do trabalhador rural. O mercado parece saber disso e, por essa razão, a aprovação do texto na CCJ não serviu para animar os especuladores. A reforma da Previdência parece ser o grande termômetro do governo Bolsonaro com as forças que o elegeram, em especial do mercado financeiro, e o caminho parece não estar tranquilo. A próxima etapa é a análise da Comissão Especial da reforma, que foi instaurada no final do mês, com 49 parlamentares titulares e 49 suplentes. Apesar da aparente maioria, o governo ainda deve encontrar um terreno sinuoso para a tramitação do texto.
O Decreto 9759/2019, na medida em que extingue conselhos sociais com participação da sociedade civil, é mais uma quebra de direitos conquistados e garantidos pela Constituição de 1988, levando o governo Bolsonaro a ser novamente aquele que pretende assinar o obituário da Nova República. A economia gerada com a extinção do conselho não representa quase nada no orçamento da União, uma vez que os conselheiros não são remunerados e o governo apenas arcava com despesas de passagens, hospedagem e alimentação.
Esses conselhos vinham de uma visão do que é representação e participação da população e ao que parece o governo quer desarticular a sociedade e impedir a participação e fiscalização, retirando do povo o poder que a Constituição lhe garante.
A medida recebeu críticas da Transparência Brasil, que vê na decisão do presidente a diminuição da transparência e do controle social sobre o governo ao reduzir a participação da sociedade civil em processos decisórios do Poder Executivo. “Ao extinguir e limitar a atuação de conselhos que preveem participação da sociedade civil sem qualquer consulta prévia aos participantes, exposição de motivos e transparência, o governo mostra que não está interessado em ouvir o que a sociedade tem para dizer”, disse a entidade em nota.
Ainda, o governo não respondeu como pretende, e se pretende, continuar o trabalho de identificação das ossadas. Respondeu apenas que “está avaliando, estudando e proporá algo dentro dos parâmetros do decreto”. O decreto vai ao encontro de posições já adotadas pelo governo que presta homenagens a torturadores e ao golpe militar. Em vez de se esclarecer o passado, o governo estimula práticas da ditadura.
Já no mercado de trabalho, a letargia é um reflexo de que o governo Bolsonaro, que aprofunda as políticas de desmonte de Temer, não tem sido capaz de gerar empregos no Brasil nestes primeiros três meses. No mês passado, quando da divulgação dos dados de emprego pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – que também mostrava sucessivos recordes negativos – o presidente escolheu atacar a metodologia da instituição de forma completamente equivocada, ao invés de admitir que reflete a realidade que se percebe na sociedade brasileira.
Sobre o golpe de 1964, a esquerda foi contra a determinação de Bolsonaro para que o 31 de março, dia do golpe que instaurou a ditadura militar em 1964, fosse comemorado. Líderes do centrão avaliaram que o Planalto não deveria ter divulgado o vídeo a favor do golpe de 1964. A Comissão Arns, composta por intelectuais, juristas e personalidades públicas, se posicionou em repúdio ao vídeo e avaliou que os cem primeiros dias da gestão Jair Bolsonaro indicam retrocessos nas políticas de Direitos Humanos. O MMFDH, no entanto, não se posicionou sobre a questão.
Sobre os direitos indígenas, o governo de Jair Bolsonaro aposta no divisionismo e procura gerar briga entre os povos indígenas. Ao escolher interlocutores sem representatividade nas aldeias, índios que às vezes buscam apenas interesses próprios, sem olhar os interesses dos povos indígenas, o governo fechou canais de diálogo.
Sobre os indígenas venezuelanos, o objetivo do encontro supracitado é uma ação conjunta para aprimorar a resposta do Estado brasileiro no atendimento a estes povos. No entanto, o posicionamento que o governo tem adotado frente aos conflitos na Venezuela tornam suspeita a adoção da medida. Seria necessário o acompanhamento de agências reguladoras como a da Organização das Nações Unidas (ONU) para verificar os trabalhos.
Sobre a reforma administrativa, a subdivisão da Funai entre o MMFDH e o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastacimento (Mapa) não está dando certo. O presidente transferiu para o Mapa a demarcação de terras indígenas. Líderes da Câmara querem tirar a função de demarcação das terras indígenas, que hoje está com a ministra Tereza Cristina (Agricultura), e devolvê-la para a Funai, que voltaria a ser vinculada ao Ministério da Justiça.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), também manifestaram intenção de devolver a Funai ao Ministério da Justiça. A oposição avalia que entregar a demarcação de terras indígenas para o Ministério da Agricultura é como deixar “a raposa tomando conta do galinheiro”.
Moro alega que a questão indígena trata mais de oportunidade de desenvolvimento e preservação das tradições do que uma questão de polícia, e considera que o Ministério da Justiça e Segurança Pública não é o melhor lugar para tratar a questão. O Ministério da Justiça sabe que a questão indígena é um problema e que vai colocá-lo na linha de frente contra a bancada ruralista, e evita essa posição. Finalmente, sobre o combate ao feminicídio, a campanha poderia ser boa, porém já começa com um foco estereotipado, direcionada a profissionais que lidam com mulheres, como os do campo da beleza. Em sua fala, no lançamento da campanha, Damares reforça os estereótipos machistas ao dizer que “o menino, na escola, vai ter que aprender a respeitar e a proteger a menina”.