Relatório sobre Gestão da Política Econômica – setembro/19

Fatos relevantes e medidas de governo

O preâmbulo de uma resolução publicada pelo Conselho do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) anuncia que o governo pretende estimular o transporte de cabotagem no país, hoje restrito a empresas nacionais, abrindo o setor para embarcações estrangeiras e assim ampliar a competição e reduzir os preços. Diz o texto: “o transporte aquaviário de cargas é comparativamente mais eficiente, seguro e apresenta menores custos e impactos ambientais que o modal rodoviário ou ferroviário”. (…) a maior participação do transporte por cabotagem “é a medida mais eficaz e célere para equilibrar os dispêndios excessivos da União, dos Estados, Distrito Federal e Municípios em projetos de infraestrutura rodoviária e ferroviária”. Se de fato for adiante, essa medida deve tensionar ainda mais a relação do governo com os caminhoneiros.

O governo federal estima abrir mão de R$ 331,2 bilhões de arrecadação no ano que vem por conta de renúncias tributárias. O valor, equivalente a 4,35% do Produto Interno Bruto (PIB). foi enviado ao Congresso Nacional pela Receita Federal para compor o Orçamento do ano que vem e significará um aumento de 8,09% em relação ao gasto tributário de 2019;

A Proposta de Lei Orçamentária (PLOA) de 2020, encaminhada pelo governo para o Congresso Nacional prevê a redução de 41% nas verbas do programa “Minha Casa, Minha Vida” (MCMV), o que equivale a um corte de R$ 1,9 bilhão. Se aprovada a PLOA, apenas R$ 2,7 bilhões serão destinados ao programa no ano que vem. De 2009 a 2018, a média anual orçamentária do MCMV foi de R$ 11,3 bilhões.

Com o objetivo de estimular o crédito para capital de giro das empresas, o Ministério da Economia estuda uma proposta de mudança numa regra da Justiça do Trabalho liberando R$ 65 bilhões que atualmente estão parados na forma de depósitos recursais.

Por conta da queda das vendas para o mercado interno no último mês de agosto (-2,3%) e ainda em razão da forte contração 34,7% das exportações para a Argentina (comparado ao mesmo mês de 2018), a produção de veículos caiu 7,3% em agosto e o número de empregados no setor diminui 4%, ambos na comparação com o mesmo mês do ano passado.

O Ministério da Economia anunciou que prepara proposta de venda das empresas da União que detém dados cadastrais da população brasileira (Serpro e Dataprev). Só no ano passado o Serpro teve uma receita líquida de R$ 2,7 bilhões, e a Dataprev, de R$ 1,26 bilhão. A primeira possui cerca de 9.100 funcionários concursados, a segunda, 3.400. No mercado, juntas, as empresas têm o valor estimado de seis bilhões de reais, sem considerar o valor das informações que armazenam.

A despeito de seu discurso radicalmente privatista, do definhamento do BNDES e do crescente abandono das funções públicas do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal (CEF), o governo anunciou que pretende criar um banco estatal para financiar o setor de defesa. Por estranho que pareça, a proposta inclui aportes do BNDES no novo banco.

Está em discussão no governo a possibilidade de acabar com o monopólio da Caixa sobre o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço). Pela regra atual, a CEF recebe 1% dos aportes do fundo para gerenciar os recursos, que no ano passado alcançaram um total que chegou a R$ 5,1 bilhões.

O Parlamento da Áustria rejeitou o acordo UE-Mercosul, o que poderá bloquear uma ratificação unânime no Conselho Europeu, inviabilizando o acordo. A postura brasileira sobre as queimadas na Amazônia foi uma das questões que gerou críticas ao pacto.

O governo descontingenciou R$ 12,5 bilhões do Orçamento de 2019, evitando o risco iminente de apagão operacional em vários ministérios. A medida veio acompanhada de uma revisão na estimativa de gastos com servidores na União, cujo valor estava estranhamente inflado em R$ 5,8 bilhões.

Bolsonaro sancionou, com alguns vetos, a MP da “Liberdade Econômica”, esvaziando o poder regulatório do Estado sobre diversas atividades econômicas e flexibilizando ainda mais as a regulação do trabalho no país.

Balanço crítico

Os dados já disponíveis sobre o nível de atividade da economia brasileira neste terceiro trimestre de 2019 reafirmam o ritmo moroso que tem marcado este primeiro ano de governo Bolsonaro. O governo, entretanto, nada faz de efetivo para alterar esse quadro, muito pelo contrário, dá sinais de que falsifica as projeções oficiais para impor ainda maiores sacrifícios ao país cortando gastos públicos essenciais e reduzindo o papel do Estado.
De todas as barbaridades que o país assiste na condução da política econômica, certamente é na seara fiscal que se encontram os maiores equívocos e, por que não dizer, uma gestão irresponsável que tangencia o dolo. Nas últimas semanas, vieram à tona uma série de revelações e denúncias de manipulações de informações fiscais por parte do governo, cujas motivações em nada se alinham aos valores da democracia e com os princípios da transparência e da publicidade que se requer da administração pública.

Em primeiro lugar, no Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do quarto trimestre do ano, o governo fez uma surpreendente reavaliação da dotação orçamentária destinada às despesas com servidores da União, reduzindo-a em R$ 5,8 bilhões, sob a alegação de anterior superestimação na LDO e no relatório do terceiro trimestre. Além da estranheza com a dimensão do erro – muito superior a ajustes orçamentários do tipo que ocorreram em anos anteriores – a justificativa governamental de que a alteração se devia à não ocorrência de reajustes dos servidores no montante que se esperava também pareceu pouco convincente, afinal esse tipo de situação se repete todos os anos e nem por isso as divergências alcançam a casa dos R$ 5 bilhões.

Em segundo lugar, talvez por conta do novo patamar de gastos com servidores da União (sem os tais R$ 5,8 bilhões) o ministro Paulo Guedes veio à imprensa para informar que irá se reunir com os presidentes da Câmara e do Senado com o intuito de alterar a proposta orçamentária recém-encaminhada ao Congresso, uma vez que nos cálculos do ministério da Economia também em 2020 serão menores as despesas com servidores.
Por fim, em outra frente, por conta de uma investigação realizada por professores da Unicamp e técnicos especializados em cálculos previdenciários, veio a público a informação de que aparentemente há uma série de erros nas contas realizadas pela equipe do ministério da Economia que subsidiaram a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma da Previdência. Como os erros apontavam sempre no sentido de superestimar as despesas do sistema e subestimar as receitas, não seria de todo estranho supor que houve uma deliberada iniciativa dos técnicos do governo para amplificar o déficit e assim justificar ajustes mais severos no sistema previdenciário que resultará da PEC que tramita no Congresso.

Com tudo isto somado – como, inclusive, alguns especialistas em contas públicas têm alertado na imprensa – fica a impressão de que a ideologia ultraliberal que predomina na atual gestão tem levado o governo a manipular as análises oficiais das contas públicas com a intenção de projetar um quadro artificial de crise fiscal e assim, conseguir respaldo da sociedade, para continuar cortando despesas e reduzindo o tamanho do Estado.

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