Relatório sobre Democracia – julho/2019
Publicado 05/08/2019 - Atualizado 08/08/2019
Considerações Gerais:
O governo Bolsonaro continua sua marcha autoritária e antidemocrática. As declarações do Presidente da República de desprezo às instituições, de ataque aos direitos humanos e de caráter preconceituoso revelam a falta de decoro e de respeito ao povo brasileiro. Medidas de caráter discricionário, que violam a Constituição, são tomadas por ministros e integrantes do governo.
Vamos a alguns fatos:
1 – Ataque à liberdade de imprensa
O governo federal mantém sua postura de confronto e perseguição à imprensa. O jornalista Glenn Greenwald tornou-se o principal alvo de Bolsonaro e Sérgio Moro desde que iniciou a publicação de reportagens com o conteúdo de mensagens trocadas entre procuradores da Força Tarefa Lava Jato e o ex-juiz Sérgio Moro.
Jair Bolsonaro já se referiu a Glenn como militante e não como jornalista. O presidente disse que o ganhador do Prêmio Pulitzer “talvez pegue uma cana aqui no Brasil”. A manifestação de Bolsonaro repercutiu internacionalmente. O relator para a liberdade de expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH-OEA) manifestou publicamente sua preocupação com as violações à liberdade de expressão em curso no país e os ataques a jornalistas e ao direito ao sigilo da fonte.
2 – Portaria 666
Sérgio Moro publicou portaria do Ministério da Justiça de número 666, em 25 de julho, que “dispõe sobre o impedimento de ingresso, a repatriação e a deportação sumária de pessoa perigosa ou que tenha praticado ato contrário aos princípios e objetivos dispostos na Constituição”. Publicada no momento em que a Polícia Federal prendeu os suspeitos de serem a fonte do The Intercept Brasil e sendo Glenn jornalista norte-americano é difícil não pensar na relação entre as duas coisas. Mesmo que Glenn seja casado com cidadão brasileiro e pai de duas crianças brasileiras, o que de acordo com a legislação altera seu status de estrangeiro, a medida soa como ameaça e tentativa de cerceamento à liberdade do jornalista. Além do mais, é uma medida autoritária, porque praticamente impede a defesa de estrangeiros que possam ser enquadrados pela portaria e, principalmente, porque passa por cima da lei da Imigração e de outras garantias constitucionais.
3 – Ataque ao Nordeste
Em áudio captado antes do início de café da manhã com jornalistas, Jair Bolsonaro fala para Onyx Lorenzoni, ministro-chefe da Casa Civil: “Daqueles governadores de paraíba, o pior é o do Maranhão [Flávio Dino, do PCdoB]. Tem que ter nada com esse cara”. A frase gerou indignação e mobilizou reações em todo o nordeste. Juristas e lideranças do campo democrático e popular afirmam que a manifestação preconceituosa de Bolsonaro é passível de punição pela lei, porque além de violar a impessoalidade nas relações institucionais, pode configurar falta de decoro por parte do presidente da República.
4 – Ataque ao presidente da OAB e Mudança na Comissão da Verdade
O presidente Jair Bolsonaro atacou o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, pela atuação na investigação do caso de Adélio Bispo, autor do ferimento a faca que sofreu no período eleitoral, e disse que, “se a OAB quiser”,pode explicar como “o pai dele [presidente da OAB] desapareceu no período militar”.
O pai de Santa Cruz foi assassinado pela ditadura militar. Em sua declaração, Jair Bolsonaro atacou a memória do pai do presidente da OAB e ainda afirmou que quem matou Fernando Santa Cruz foram os próprios companheiros.
Ele aproveitou para, mais uma vez, atacar a Comissão da Verdade. Além de continuar insinuando que o trabalho da comissão era uma mentira, Bolsonaro alterou a sua composição.
Por decreto publicado em 01/08, Bolsonaro alterou a composição da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos, vinculada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. O decreto altera quatro dos sete integrantes do colegiado e vem assinado pelo presidente e também pela ministra da Mulher, Damares Alves. Passam a compor a comissão dois militares e dois integrantes do partido do presidente (PSL),respectivamente: Weslei Antônio Maretti, Vital Lima Santos.
5 – Censura no Itamaraty
O Itamaraty se recusou a publicar o livro Alexandre de Gusmão (1695-1753): O Estadista que Desenhou o Mapa do Brasil, escrito por um dos maiores historiadores da diplomacia brasileira, o embaixador Synesio Sampaio Goes Filho.
O autor foi informado que a obra só seria publicada se ele retirasse o prefácio escrito por Rubens Ricupero, ex-embaixador em Washington e também historiador da diplomacia. Ricupero é um desafeto do atual chanceler Ernesto Araújo, por criticar os rumos da atual política externa do
governo Bolsonaro.
Goes Filho afirmou ao jornal Folha de S.Paulo que o veto é uma censura. “Isso é censura, obscurantismo; desse jeito nenhum embaixador de prestígio vai poder publicar”. “É um assunto do século 18, e o autor foi vetado porque critica o ministro, não pelo que escreveu”, disse Goes Filho. “E o Itamaraty fica, perto dos 200 anos da Independência, sem um texto sobre o estadista”.
6 – Ataque ao INPE
O presidente Jair Bolsonaro também mirou contra o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Depois da divulgação de dados que alertam para o aumento do desmatamento na Amazônia, Bolsonaro criticou o diretor do Instituto, Ricardo Galvão, que tem mandato até 2020.
Bolsonaro questionou a credibilidade dos dados coletados pelo INPE e ainda ameaçou Galvão de demissão: “Se quebrar confiança vai ser demitido sumariamente, não tem desculpa para nenhum subordinado ao governo divulgar dado com esse peso de importância para o nosso Brasil. A questão de perder a confiança, no meu entender é uma pena capital. Nem na vida particular convivemos com pessoas que perdemos confiança.Temos muita responsabilidade em identificar se houve má fé ou não”, disse em tom autoritário.
Análise Crítica
Bolsonaro mantém a linha de protagonizar crises como método de governo. Ele ataca a todos os que de alguma maneira criticam seu governo. Não escolhe adversários, tudo e todos estão na mira do presidente.
Essa perseguição não se limita a manifestações aparentemente tresloucadas do presidente, ela se desdobra em atitudes autoritárias, que violam direitos fundamentais e instauram um estado de exceção no país.
As atitudes do presidente e dos ministros extrapolam a Esplanada dos Ministérios e alimentam a base ultrarradicalizada de direita que mantém praticamente imóvel o índice de 30% de apoio ao governo. Nas ruas no último 30 de junho, a turba da ultra-direita levantou cartazes pedindo o fechamento do STF e do Congresso Nacional.
O tom dos ataques à democracia e à liberdade de expressão continua crescendo, criando um ambiente de insegurança.