Relatório sobre Gestão da Política Econômica – Junho/2019

Fatos relevantes e medidas

  • No último dia 28 de junho o Mercosul e a União Europeia concluíram o acordo de livre comercio entre os dois blocos. As negociações que vinham sendo feitas desde 1998 resultaram na assinatura de um tratado que alcança o comércio de bens e serviços, os investimentos, as compras governamentais e os direitos de propriedade intelectual. Nos próximos meses, o acordo precisará ser aprovado e ratificado pelos parlamentos de todos os países envolvidos e só deverá entrar em vigor em um prazo não inferior a um ano.
  • Os dois principais indicadores antecedentes do PIB disponíveis no país registraram contração na passagem de março para abril, já considerados os ajustes sazonais: o IBC-Br (Banco Central) registrou queda de 0,47% do PIB enquanto de acordo com o Monitor do PIB (FGV) a contração foi de 0,1%. Com isso, no trimestre encerrado em abril, a queda apurada pelo Monitor da FGV alcançou 0,9%, resultante de contrações observadas nos três setores produtivos da economia: agropecuária (-2%), indústria (-1,3%) e serviços (-0,2%).
  • A Odebrecht teve seu pedido de recuperação nacional aceito pela justiça no dia 18 de junho. A dívida total da empresa é de 98 bilhões de reais. Desse montante, R$ 10 bilhões são devidos ao BNDES; R$ 7,8 bilhões ao Banco do Brasil; e outros R$ 5 bilhões à Caixa Econômica Federal. Já os bancos privados têm R$ 8,4 bilhões a receber. Além da enorme dívida acumulada, a crise econômica e principalmente os impactos desastrosos da Operação Lava Jato sobre os negócios da empresa resultaram na eliminação de 228 mil empregos diretos nos últimos cinco anos.
  • A Boeing Brasil Commercial (joint venture da Boeing e da Embraer) anunciou as etapas de montagem final das aeronaves comerciais que estavam sendo realizadas na unidade de São José dos Campos serão transferidas para as unidades de Gavião Peixoto (SP) e para Melbourne (Flórida).
  • A Toyota anunciou para agosto a demissão de um total de 840 trabalhadores de suas plantas em Sorocaba e Porto Feliz em decorrência do encerramento do terceiro turno nas duas unidades. Segundo nota da empresa a decisão foi tomada por conta da contração das exportações de automóveis e motores – notadamente para a Argentina – e pelo fraco desempenho das vendas no mercado interno.
  • O acirramento da tensão entre os EUA e o Irã já impacta as exportações dos frigoríficos brasileiros para o país, terceiro principal destino das exportações brasileiras de carne. De acordo com notícia do jornal Valor Econômico (24/06) o alinhamento de Bolsonaro aos EUA tem dificultado o fechamento de novos contratos de exportação para o mercado iraniano.
  • No dia 5 de junho, a Câmara dos Deputados aprovou a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que engessa ainda mais o poder do Executivo sobre o Orçamento da União. Uma vez promulgada, a PEC tornará impositivas as emendas de bancadas estaduais apresentadas no Congresso Nacional. De acordo com a lei vigente até o momento, apenas as emendas individuais dos congressistas tinham execução obrigatória.
  • O secretário especial da Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, anunciou que o governo pretende resgatar para o Tesouro Nacional cerca de R$ 20 bilhões dos recursos do PIS/Pasep que não forem sacados pelos seus donos e que usualmente são utilizados pelos bancos públicos. A medida, que visa aprofundar o ajuste fiscal e que pode sofrer contestações judiciais, deverá impactar negativamente a já reduzida capacidade de financiamento dos três bancos públicos federais.
  • De acordo com a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), o endividamento das famílias brasileiras aumentou pelo 5º mês consecutivo em maio, alcançando o percentual de 63,4%, um aumento de 4,4% em relação ao mesmo mês de 2018. Já a inadimplência cresceu 2,3% no mesmo comparativo.
  • Por resistir às pressões de Paulo Guedes para que fossem repassados recursos do BNDES para o Tesouro Nacional na velocidade e volume que eram desejados pelo Ministro da Economia, o presidente do banco, Joaquim Levy, foi demitido e para o seu lugar foi indicado Gustavo Montezano, um jovem economista com passagens pelos bancos Oportunity e BTG/Pactual e amigo de juventude dos filhos de Bolsonaro. Essa troca de comando deve acelerar o processo de descapitalização do BNDES.
  • Na proposta do relator da Comissão Especial que está analisando a PEC da reforma da previdência, dep. Samuel Moreira (MDB), o artigo 239 da CF deverá ser alterado, deixando-se de destinar 40% da arrecadação do FAT para compor as fontes do BNDES. Tal medida, se aprovada, implica em grave descapitalização do banco, reduzindo um dos principais instrumentos para o financiamento da indústria e da infraestrutura no país.

Balanço Crítico

Ao longo deste mês de junho o governo Bolsonaro adotou algumas graves medidas com potencial de agravar o processo de desindustrialização precoce em curso no país, comprometendo não apenas a recuperação da atividade econômica no curto prazo, mas também as bases autônomas de um futuro ciclo de desenvolvimento nacional.

Por um lado, as investidas contra o capital do BNDES transferindo parte de seus recursos para ajudar no custeio dos gastos correntes do governo central constituem enorme retrocesso que deverá reduzir ainda mais a já insuficiente taxa de investimento do país, hoje em patamar de 15,5%, o mais baixo de nossa história.

Por outro lado, embora não se conheça ainda em detalhes os termos do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia, é possível desde logo fazer algumas considerações sobre suas linhas centrais.

Em primeiro lugar, a se considerar o que foi divulgado até o momento, as economias do Mercosul deverão sofrer uma invasão de bens industriais de todo tipo em troca de uma incerta e duvidosa – visto que persistem as barreiras fitossanitárias, passíveis de serem acionadas a qualquer momento e de difícil contestação – abertura dos mercados europeus para seus produtos de agropecuária. Com isso, a liquidação do que resta do parque industrial no Brasil e na Argentina passa a ser um cenário bastante provável.

Apenas para o caso brasileiro, de acordo com cálculos da LCA Consultores a redução das barreiras tarifárias sobre as importações de bens de capital, de informática e de telecomunicação deverá resultar em um encolhimento imediato da ordem de 7% da produção destes importantes ramos da indústria nacional.

Além disso, cabe destacar que mesmo as vantagens abertas para as exportações do agronegócio são sensivelmente inferiores àquelas que eram defendidas há alguns anos. A se considerar as informações divulgadas pela imprensa europeia, as cotas mínimas (com isenção tarifaria) reivindicadas pelas nações do Mercosul para as exportações de carne bovina, grãos e etanol foram substancialmente reduzidas no documento final do acordo. É provável, portanto, que as cotas conquistadas pelo Mercosul para as exportações do agronegócio no mercado europeu não sejam suficientes para compensar a maciça ampliação da importação de bens industriais produzidos pelos europeus.

Por fim, outro aspecto problemático e de grave repercussão diz respeito aos novos termos das políticas de compras governamentais. Com o novo tratado comercial, as possibilidades de uso das compras públicas para fortalecer produtos com conteúdo local devem ficar sensivelmente prejudicadas, eliminando um dos poucos instrumentos de política industrial que vinham demonstrando eficácia nas duas últimas décadas.

Ao que parece, os negociadores europeus se aproveitaram da breve “janela de oportunidade” política aberta pelo alinhamento neoliberal dos governos do Brasil e da Argentina para sacramentar um acordo em bases que lhes sejam mais favoráveis, antecipando-se a possíveis mudanças políticas nos governos do bloco sul-americano.

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