Relatório sobre Ciência & Tecnologia – Junho/2019

FATOS RELEVANTES

Passados seis meses à frente do governo federal os atuais governantes não foram capazes de reverter o quadro de desconstrução do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação – SNCTI.

Segue o ritmo de desmonte do sistema: secundário, no desenho federal, ao se tornar refém do setor de Comunicações, a partir da junção desta área ao ministério; diminuído, nos projetos e atividades finalísticas, devido à redução acentuada de recursos associada à ausência absoluta de propostas para reverter tal situação.

No mês de junho, duas medidas para área de Comunicações, braço de maior relevância no MCTIC. Ambas de natureza tributária que, em essência, afetam, de forma positiva e negativa, empresas da cadeia de Telecomunicações – Telecom.

No semestre, para compensar o principal fato relevante, constituído pelo contingenciamento de R$ 2,1 bilhões do MCTIC, que será transformado em corte efetivo com a redução da atividade econômica nacional, foi assinado o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas – AST com os Estados Unidos para o uso da base e realização de operações para o lançamento de foguetes e satélites da Base de Alcântara, no Maranhão. Cláusula que poderia dar ânimo ao setor e apontar novos rumos, não fossem os termos apresentados, assemelhados, alguns, e iguais, outros, à proposta de “parceria” apresentada em 2000 e barrada pelo Congresso Nacional à época.

Excluído o Acordo, enviado ao Congresso, em discussão na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional – CREDN, da Câmara dos Deputados, disputas, inconclusivas e previamente derrotadas, dos dirigentes do ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações – MCTIC, por migalhas orçamentárias e financeiras que restam (ainda) e reuniões buscando evitar a extinção de empresas vinculadas à Pasta.

Discussão inútil, entretanto. Se não vier o fechamento por orientação regrada superior, virá, no tempo, pela aplicação da Emenda Constitucional n° 95 (EC 95, “Teto de Gastos”), que obrigará, pela falta de recursos, custeio fundamentalmente, o enceramento das atividades, não só de empresas, mas também de institutos e organizações sociais.

Fato outro, que poderia ter sido positivo, mas que pecou pela omissão ou, provavelmente, por veto superior, foi a ausência, no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO 2020), da inclusão das “Ações de Ciência, Tecnologia e Inovação” no rol das despesas que não sofrerão limitação de empenho (Anexo III, PLN, Seção II), nos termos autorizados pelo artigo 9°, § 2°, da Lei de Responsabilidade Fiscal- LRF, decisão política nacional presente nas LDOs de 2003 (no próprio texto da Lei) a 2011 (nos Anexos). Não apareceu, ao mínimo, no PLDO 2020 como ressalvado, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FNDCT, como contábil, no mesmo dispositivo em que estão, corretamente, os Fundos Constitucionais de Financiamento do Nordeste – FNE, do Norte – FNO e Centro-Oeste – FCO. Uns e outro tem o mesmo objetivo: reduzir desigualdades regionais e sociais.

Como o PLDO está ainda em tramitação no Congresso, em fase de emendamento, há tempo para reverter esta situação, incluindo CT&I ou FNDCT no Anexo de Ressalva. Seria mais uma solução oriunda do Congresso, não do Poder Executivo, assim como deverá ser, mas por enquanto apenas promessa, a destinação de R$ 330 milhões para bolsas de pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, dotação esta articulada pelos parlamentares da Comissão de Orçamento como uma das condições para aprovação do projeto de crédito de R$ 248 bilhões.

MEDIDAS PROPOSTAS:
Em julho, com alguma relevância, medidas de natureza tributária direcionado ao setor de Telecom.

A primeira foi o anúncio, no dia 16, pelo presidente da República, do corte do Imposto de Importação – II sobre bens de informática e telecomunicações e equipamentos para automação (bens de capital), de 16% para 4%. Embora haja alíquotas que variam de 6% a 16% sobre Bens de Informática e Telecomunicações (BIT) e de Capital (BK), a maior parte é taxada 12% (BIT) e 14% (BK).

Essa medida não foi concretizada, todavia. Falta edição de portaria exclusiva da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais, vinculada ao ministério da Economia, definindo percentuais e prazo transicional para chegar aos 4%.

Até dezembro de 2018, a Câmara de Comércio Exterior – CAMEX, através de seu Conselho de Ministros (Casa Civil, Relações Exteriores, Transporte, Agricultura, Fazenda e Planejamento), era responsável por tal decisão. A reforma administrativa do atual governo retirou tal decisão do colegiado. O assunto havia sido levado à reunião da CAMEX ao final do governo passado, mas não foi resolvido sob a justificativa da necessidade de mais estudos. A proposta feita pela CAMEX previa que a redução do II para 4% fosse feita gradualmente, até 2021.

A oficialização desta redução, sem uma reforma tributária conjugada, impactará imediatamente sobre a atividade das empresas instaladas no país, mas, de forma mais acentuada, sobre o parque industrial da Zona Franca de Manaus.

Ao definir como IoTa infraestrutura que integra a prestação de Serviços de Valor Agregado – SVA 3, enquadra estes dispositivos no chamado FISTEL reduzido, taxando a empresa em R$ 5,68 no primeiro e apenas R$ 1,89,a partir do segundo.

A segunda, foi a edição do Decreto no 9.854, em 24 de junho, que instituiu o Plano Nacional de Internet das Coisas (IoT – Internet of Things, art. 2º, I do Decreto) e estatuiu a Câmara de IoT, composta por representantes do MCTIC, que a dirigirá, Economia, Agricultura, Saúde e Desenvolvimento Regional. Em seu bojo o enquadramento dos equipamentos de Telecom como infraestrutura do sistema IoT, permitindo às empresas do setor passarem ao largo da cobrança do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadoras – ICMS 1, além de obter alívio nas cargas tributárias devidas ao Fundo de Fiscalização das Telecomunicações – FISTEL, gerido pela Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL, como as taxas aplicadas pela Agência sobre equipamentos de telecomunicações, de antenas a celulares, que oneram as empresas em R$ 40, para produtos ativados, ou R$ 5, na quota reduzida, em sistemas de comunicação máquina a máquina.

As Salvaguardas Tecnológicas relacionadas à participação dos EUA em lançamentos a partir do Centro Espacial de Alcântara – CLA, assinado em Washington, em 18 de março, em discussão na CREDN da Câmara Federal, que poderia ser um bom produto para deslanchar a Programa Espacial Brasileiro, se fosse apenas um AST, peca por desencontros no texto suplementar que o acompanha, assim como mantém restrições ao Brasil, iguais àquelas constantes do Acordo assinado pelos dois países em 18 de abril de 2000.

De forma perturbadora para soberania nacional, enquanto o § 7°, do artigo VI do Acordo, prevê que as Partes estão de acordo que os órgãos de polícia e de prestação de socorro emergencial brasileiro, como polícias e corpo de bombeiros, poderão acessar as áreas restritas, caso necessário, o subitem B, do item 3 do documento intitulado “Orientação Operacional”, apresentado pelo ministro à Comissão como suplementar, mas não componente dos documentos oficiais em avaliação pela mesma, prevê o oposto: “Os Órgãos de Polícia e de Prestação de Socorro entrarão em consultas com o Governo dos Estados Unidos antes de acessarem as Áreas Restritas ”

Sobre a relevância e importância da aprovação do AST, defende o governo brasileiro que o Acordo em discussão é idêntico aos assinados pelos EUA com outros países. É uma afirmação estranha, visto que não estão presentes em outros Acordos estadunidenses cláusulas como a vedação do uso dos recursos advindos da operação de lançamentos ser usado no desenvolvimento de veículos lançadores (Art. III, § E, AST). Ora, o desenvolvimento de foguetes e posterior operação com estes é o grande negócio do setor espacial, seja do ponto de vista estratégico, econômico ou científico e tecnológico. Nem a proibição de cooperação com Partes não membros do Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis – MTCR (Art. III, § B, AST), composto por 35 países. Tampouco a possibilidade de veto unilateral de lançamentos (Art. III, § A, AST).

3. ANÁLISE CRÍTICA:
Um mês de junho com nenhuma novidade oriunda do MCTIC, e apenas duas medidas de natureza tributária voltadas ao setor de Telecom. No Congresso tramita o AST, assinado com os Estados Unidos para o lançamento de foguetes e satélites, a partir do CLA. Está ruim, mas pode e deve o Congresso salvá-lo, devolvendo ao Executivo para revisão, através do MCTIC e das Relações Exteriores, e o firmamento de novas cláusulas. São poucas que exigem novo teor. O AST é muito importante, mas requer reciprocidade.

Notícia que diminui um pouco a tragédia por que passa a área de CT&I, vem por pressão do Congresso, se a promessa for cumprida, e o ministério da Economia repassar R$ 330 milhões ao CNPq para pagar bolsas de pesquisa, rubrica arrancada na aprovação, em 11 de junho, do crédito de R$ 248 bilhões, dotação a ser usada pelo governo federal para cobrir despesas correntes com dinheiro obtido pela emissão de títulos e aumento da dívida pública.

Seis meses, enfim, sombrios para CT&I. Mas apenas o prelúdio, porque a situação poderá ficar muito pior, a depender das normatizações locais para CT&I que advirão do acordo assinado entre União Europeia e Mercosul e da manutenção das ações do setor nas restrições da EC 95.

Notas

1 Cada Estado define a alíquota, variando de 25% em São Paulo e Minas a até 29% no Rio de Janeiro e 35% em Rondônia.

2 Atividade que acrescenta a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde novas utilidades relacionadas ao acesso, ao armazenamento, à apresentação, à movimentação ou à recuperação de informações.

3 Estabelece o valor da Taxa de Fiscalização de Instalação das estações móveis do serviço móvel pessoal, do serviço móvel celular ou de outra modalidade de serviço de telecomunicações que integrem sistemas de comunicação máquina a máquina.

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