Relatório sobre Educação – Março/19
Publicado 01/04/2019 - Atualizado 08/05/2019
Fatos relevantes:
O cenário da educação no mês de março teve como principal característica o aumento da instabilidade política no ministério. Ações e declarações atabalhoadas que enfraqueceram politicamente o ministro Ricardo Vélez, associadas à disputa por espaço entre os grupos políticos que compõe o ministério resultaram em trocas constantes de dirigentes do alto escalão e paralisia das atividades.
Além disso, a agenda econômica ultraliberal conduzida pelo Ministério da Economia aprofundou as restrições financeiras e passou a subordinar toda a ação governamental à aprovação de mudanças estruturais no arcabouço tributário e de direitos sociais exarados pela Constituição Federal de 1988. As mudanças propostas para a Previdência Social, que apontam para um modelo de capitalização assentado em bancos privados e o novo pacto federativo, que retira todas as vinculações constitucionais, pretendem condicionar os recursos disponibilizados e o paradigma da gestão educacional.
Medidas apresentadas:
As principais medidas do governo na área da educação foram apresentadas pelo ministro da economia. Dessa forma, o MEC continuou sem conseguir propor iniciativas relevantes e limitou-se a envolver-se em polêmicas e confusões.
Novo Pacto Federativo: Em entrevista no dia 13 de março, publicada pelo site UOL, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que pretende enviar ao Congresso uma proposta de novo pacto federativo, que terá como base o fim das vinculações constitucionais, inclusive o percentual dos impostos arrecadados para investimento em educação (25% estados e municípios e 18% união).
Mudança no regime de previdência dos professores: A proposta impõe uma idade mínima de 60 anos para homens e mulheres e amplia o tempo mínimo de contribuição das mulheres de 25 para 30 anos.
Criação de comissão para censurar questões do Enem: A comissão, composta por dirigentes do MEC e do Inep, será responsável por avaliar as questões do Enem, podendo recomendar a exclusão de determinados itens que considere “ideológicos”.
Lava-jato da educação: Os ministérios da Educação, da Justiça, e a Controladoria-Geral da União, além da advocacia-geral da União, assinaram um protocolo de intenções que tem como objetivo investigar eventuais atos de corrupção no âmbito do MEC e autarquias nas gestões anteriores.
Análise crítica:
O anúncio do ministro Paulo Guedes de um novo pacto federativo com o fim das vinculações orçamentárias previstas na Constituição Federal de 1988 reafirma o sentido geral da agenda educacional, caracterizada pela redução drástica de recursos para a área e transferência de responsabilidades para o setor privado. Temas como a continuidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), que expira em 2019, e o Custo-Aluno-Qualidade (CAQ), previsto no Plano Nacional de Educação (PNE), estão ameaçados pelo novo modelo proposto.
No que se refere às mudanças na previdência para as professoras e professores, o governo penaliza essas carreiras de forma extremamente injusta. A proposta impõe uma idade mínima de 60 anos para homens e mulheres e amplia o tempo mínimo de contribuição das mulheres de 25 para 30 anos.
Inicialmente, deve-se considerar que, de um modo geral, os professores começam suas carreiras muito cedo, com pouca idade. Não é por acaso que a legislação vigente não estabelecia idade mínima.
Outro aspecto a ser considerado é que a atividade docente é extremamente desgastante e o estresse é uma realidade generalizada na carreira. A própria OIT reconhece o estresse como “um risco ocupacional significativo da profissão”.
Na França, estudos sobre a saúde mental dos docentes mostram que os diagnósticos mais frequentes são: estados neuróticos (27%); estados depressivos (26,2%), personalidades e caracteres patológicos (17,6%); estados psicóticos, psicoses maníaco-depressivas (7,4%) e esquizofrenias (6,6%). Estes estudos mostram também que a frequência desses diagnósticos é maior entre docentes do que em outros grupos profissionais.
No caso do Brasil, a situação é ainda mais grave. O estudo da OCDE (Education at a Glance 2016) revelou que o professor brasileiro desempenha a maior jornada anual de trabalho em sala de aula (42 semanas contra 40 e 37 semanas nos demais países, sendo 19 horas semanais em média na sala de aula contra 15 da média pesquisada).
Sobre a comissão de censura para o Enem, o governo adota uma medida equivocada, que ameaça a integridade do exame, para manter mobilizada sua base conservadora com o discurso de combate ao pensamento de esquerda. Além de representar claramente a censura a determinado pensamento e o veto a temas fundamentais como o combate a homofobia e a desigualdade de gênero, a comissão viola o sigilo da prova e coloca em risco sua integridade.
No que tange a chamada Lava-Jato da Educação, trata-se de uma operação com claro objetivo atingir as universidades públicas, que são o foco preferencial para cortes no orçamento e tem se apresentado como um importante centro de resistência às políticas do atual governo.
A operação é descabida e eivada de obscuridades, por não se basear em nenhum indício concreto de irregularidade pode ser facilmente manipulada. Abrir uma investigação ampla para depois encontrar uma irregularidade é típico de regimes autoritários para adversários políticos.