Relatório sobre Educação – Fevereiro/19

  1. FATOS RELEVANTES:

As primeiras iniciativas do governo Bolsonaro na área da educação estão profundamente vinculadas às ideias dominantes no campo político e econômico que delineiam toda a ação governamental. Nesse sentido, as iniciativas do governo precisam ser analisadas a partir de dois prismas condicionantes: um primeiro relacionado à agenda econômica neoliberal e o segundo baseado no combate ideológico aos ideais progressistas e humanistas.

No campo econômico, a guinada liberalizante iniciada por Temer e aprofundada por Bolsonaro se caracteriza por uma radical política de austeridade, pela privatização de serviços públicos e pela desregulação das atividades econômicas. No caso da educação, a medida mais relevante a ser destacada é a vigência da Emenda Constitucional 95, de 15 de dezembro de 2016 (EC 95/2016), que congelou os recursos das áreas sociais por 20 anos.

 Trata-se de uma medida estruturante que condiciona toda a agenda educacional, inviabiliza o investimento público e força a adoção de soluções por meio da iniciativa privada. O impacto dessa medida já pode ser sentido, de acordo com a consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados, as despesas primárias do Ministério da Educação após a vigência do teto de gastos foram reduzidas em R$9 bilhões.

  1. MEDIDAS PROPOSTAS:

Existem ainda poucas medidas formalizadas pelo governo, entretanto, as declarações públicas proferidas por ministros abordando o tema permitem identificar o sentido geral das ações a serem desenvolvidas.

Ações já formalizadas:

Metados 100 primeiros dias: Dentre as 35 metas apresentadas pelo governo Bolsonaro para os 100 primeiros dias de governo, constam apenas duas relacionadas diretamente com o tema da educação. São elas:

 Alfabetização:“Lançamento de um programa nacional de definição de soluções didáticas e pedagógicas para alfabetização,com a proposição de método para redução do analfabetismo a partir de evidências científicas”.

Educação domiciliar: Regulamentar o direito à educação domiciliar.

Financiamento:Em entrevista no dia 02 de janeiro, publicada pelo site UOL/Folhade S.Paulo,o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que pretende retirar a vinculação constitucional de percentual dos impostos arrecadados para investimento em educação (25% dos estados e municípios e 18% da União).

 Combate ao pensamento progressista: “Escola sem partido” e combate ao “marxismo cultural”.

  1. ANÁLISE CRÍTICA:

Após 60 dias de governo, não houve qualquer abordagem sobre os temas estruturantes da agenda educacional brasileira. As medidas para o cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação (PNE) ou mesmo a definição sobre como será encaminhada a renovação do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), que expira em 2020, não foram sequer mencionadas pelo novo governo.

No entanto, com base no condicionante imposto pela EC 95/2016, na agenda econômica proposta pelo governo e pelas declarações do ministro Paulo Guedes, pode-se inferir que haverá redução no financiamento da educação. Trata-se de um vetor estruturante da ação do governo que tende a definir toda a política educacional, sinalizando para o sucateamento da educação pública e pressionando por soluções por meio da iniciativa privada.

Apesar de haver inúmeros problemas de gestão que precisam ser enfrentados pelo poder público, deve-se reconhecer que os recursos destinados à educação no Brasil são insuficientes para fazer frente aos desafios para assegurar o acesso a esse direito em condições equânimes.

Os dados comparativos do investimento em educação no Brasil com a média dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) são reveladores, enquanto o gasto público anual por aluno da educação básica a superior no Brasil é de US$ 3.400, o gasto médio da OCDE é de US$ 9.300 (US$ 5.900 a mais que o Brasil). Além disso, deve-se considerar que o Brasil possui um enorme passivo histórico de exclusão e falta de investimento em educação.

No que se refere às ações já formalizadas pelo governo dentro das metas estabelecidas para os cem primeiros dias, verifica-se enorme fragilidade nas ações propostas para a área da educação. Tanto o combate ao analfabetismo como a educação domiciliar são temas pontuais da agenda educacional brasileira, não constituem de maneira clara a um projeto nacional articulado para a educação no Brasil.

Por último, no que tange ao projeto denominado “escola sem partido”e sobre o anunciado combate ao “marxismo cultural”, cumpre demarcar que se trata do principal artifício retórico empunhado pelo atual ministro da Educação para manter mobilizados os apoiadores mais conservadores do governo e ao mesmo tempo justificar eventuais ações antidemocráticas em escolas e universidades. Isso acontece enquanto o governo aponta para a redução dos investimentos e ataca os direitos dos profissionais da educação.

 Além de funcionar como cortina de fumaça para o governo colocar em marcha sua agenda radical de austeridade, essas ações ameaçam frontalmente a liberdade de ensino.

A partir da premissa de que a educação deve atender a princípios de “neutralidade política e ideológica”, a proposta da “escola sem partido” sugere que o professor deve ser proibido de expressar qualquer opinião política ou ideológica, sendo, inclusive, passível de punição.

 Deve-se ressaltar que a dimensão da cidadania está profundamente associada ao pleno gozo da liberdade de pensamento, da expressão política eda participação social. A ideia de calar qualquer tipo de opinião em sala de aula, de impedir que se discutam assuntos políticos ou que se estimule a participação social, esvazia completamente a perspectiva de formação para o exercício da cidadania.

As questões de comportamento e combate ao pensamento de esquerda cumprem uma tripla função: funcionam como retórica mobilizadora do campo conservador para encobrir a ação de sucateamento da educação promovida pelo governo; para justificar ações antidemocráticas no interior de escolas e universidades; e para combater ideologicamente direito sociais conquistados, especialmente por mulheres, negros e população LGBT.

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