Petrobras e estatais chinesas arrematam cessões onerosas do pré-sal

Fatos relevantes e medidas de governo

Óleo e gás – Em novembro foram realizadas duas rodadas de licitação de áreas do pré-sal. Se, por um lado, o resultado favoreceu a Petrobras, que arrematou as principais áreas e assegurou um horizonte exploratório relevante, garantido o controle da operação, por outro lado, o resultado frustrou o governo que esperava contar com maior participação de petrolíferas estrangeiras e com maior arrecadação em bônus de assinatura.
Energia elétrica – O Brasil e o Paraguai deverão chegar a um acordo sobre a ata bilateral relativa à contratação de energia de Itaipu até o fim do ano, prevê o diretor-geral da parte brasileira da hidrelétrica, general Joaquim Silva e Luna. O acordo trata da contratação de energia da usina pelos dois países em 2019 e estabelece novos volumes para os anos seguintes. A demora em um consenso afeta o faturamento da segunda maior hidrelétrica do planeta, de 14 mil megawatts (MW) de capacidade, atrás apenas da usina de Três Gargantas, na China, de 22 mil MW.

Concessões – O ministro da Economia, Paulo Guedes, é contra a redação dada pelo deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) ao projeto de lei que reformula o marco legal das concessões e parcerias público-privadas (PPPs). Para a equipe econômica, o texto da nova Lei Geral das Concessões ficou extenso demais e pode ter efeito oposto à intenção de impulsionar o capital privado na infraestrutura do país.

ANÁLISE CRÍTICA

Ao responsabilizar o marco regulatório do pré-sal pelo resultado das rodadas de licitação do pré-sal, o governo reabriu o debate sobre o arranjo econômico-institucional de incentivo e proteção ao petróleo brasileiro. Sendo assim, cabe perguntar: seria o regime de partilha a causa da perda de dinamismo dos últimos leilões do pré-sal?

Na primeira rodada do excedente da cessão onerosa foram ofertadas quatro áreas da Bacia de Santos, mas apenas duas foram arrematadas, ambas pela Petrobras como operadora em um consórcio com a participação minoritária das chinesas CNOOC e CNODC, somando 10%. Nesse caso, a baixa adesão de outras grandes petrolíferas se deveu ao descasamento entre os retornos de curto-prazo esperados pelo governo e os riscos de médio prazo mensurado pelas empresas.

Noutras palavras, premido pela necessidade auto-imposta de utilizar os recursos dos leilões em seu ajuste fiscal e federativo, o governo superestimou sua capacidade de exigir o aumento dos valores e o encurtamento dos prazos para o pagamento do bônus de assinatura e subestimou os impactos de deixar em aberto a negociação das indenizações que deveriam ser pagas à Petrobras, por se tratar de área onde já se havia realizado investimentos prévios.

Na sexta rodada de partilha do pré-sal, por sua vez, foram ofertadas cinco áreas das Bacias de Campos e Santos, nesse caso apenas uma foi arrematada, também pela Petrobras como operadora em uma associação com a CNODC que totaliza 20%. Dessa vez, a desmobilização das principais majors do setor se deveu ao descompasso entre a aceleração dos leilões realizados no Brasil e, comparativamente, a desaceleração na recomposição da carteira de Exploração e Produção (E&P) das principais petrolíferas.
Em função da crescente volatilidade no preço do petróleo e de mudanças na estrutura de financiamento do setor energético, as grandes petrolíferas têm sinalizado para a redução do investimento global em E&P, priorizando projetos mais baratos e mais rápidos. Além disso, algumas dessas empresas já estão comprometidas com investimentos exploratórios em novas fronteiras, como é o caso da Exxon na Guiana ou da British Petroleum (BP) em Angola.

Se o problema estivesse no regime de partilha, as cinco rodadas dessa modalidade realizadas entre 2013 e 2018 não teriam uma taxa de sucesso de 82%, vendendo quatorze das dezessete áreas ofertadas, contando com a participação de pelo menos dez petrolíferas estrangeiras em cada certame, tendo sempre entre cinco e oito empresas vencedoras.

Diante dos riscos e incertezas, contrariando a defesa ideológica da livre concorrência feita pelo governo e reafirmando a dinâmica pragmática e oligopólica do setor, os certames recentes foram marcados por baixa competição entre as International Oil Companies e por intensa participação das National Oil Companies. Isso é resultado menos do regime regulatório proposto pelo Estado e mais das novas estratégias de mercado apresentadas pelas empresas. Disso decorre outra questão: a possível tendência de perda relativa de fôlego dos leilões faz do pré-sal um ativo de menor interesse?
Nos vinte anos que vão de 1999 a 2019, o Brasil já realizou cerca de duas dezenas de leilões (concessões, cessão onerosa e partilha), mais da metade deles ocorreu depois da descoberta do pré-sal. Com a intensificação da velocidade dos leilões nos últimos anos, as grandes petrolíferas aumentaram significativamente o volume de petróleo brasileiro em suas carteiras, Exxon, Total e BP detém, respectivamente, cerca de onze bilhões, seis bilhões e quatro bilhões de barris de óleo nacionais. Com a carteira carregada de projetos do pré-sal, essas empresas devem agora se concentrar nos projetos de desenvolvimento das reservas já arrematadas.

Sendo assim, vale rememorar que os regimes de cessão onerosa e partilha foram criados em 2010 a fim de evitar a exposição do pré-sal ao regime de concessões ins- tituído pela lei do petróleo de 1997, tendo como objetivos: fortalecer a atuação da Petrobras, adensar o arco de ação da indústria nacional e dar condições ao Estado para se apropriar e distribuir a renda petroleira levando em consideração o planejamento intertemporal e a solidariedade intergeracional.

No entanto, em 2016, mudanças regulatórias excluíram a obrigatoriedade de a Petrobras atuar como operadora com participação mínima de 30% nas áreas do pré-sal, e em 2017, alterações legislativas reduziram a obrigatoriedade de conteúdo local nos contratos de partilha de 37% para 18% na etapa de exploração e de 55% para 30% na etapa de desenvolvimento. A conjugação desses dois elementos reduziu a possibilidade de se utilizar a indústria do petróleo como motor de dinamização da própria industrialização nacional, criando uma estrutura produtiva mais exitosa e eficiente em converter commodities em recursos naturais estratégicos por meio da agregação de valor.

Apesar disso, a permanência do direito de preferência para que a Petrobras atue como operadora e a vigência de índices mínimos de conteúdo local podem servir como ponto de partida para a reativação de uma política industrial, desde que o governo revise o ritmo acelerado de seu calendário de rodadas de leilões. Ao adaptar seu apetite ousado de venda ao apetite moderado de compra do mercado, o governo pode refazer os elos de articulação entre o ritmo de exploração e produção do petróleo e o empuxo que esse setor pode exercer sobre diversos segmentos da indústria nacional, à montante e à jusante.

Grupo de Conjuntura da Fundação Perseu Abramo
Artigo integrante do boletim mensal de novembro “De Olho do Governo”

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